Dos 62 municípios do Amazonas, apenas 22 cidades têm candidaturas encabeçadas por mulheres. O que representa 36% de participação do gênero para as prefeituras em todo o estado.
As cidades de Presidente Figueiredo e Urucará são as únicas com mais de uma chapa feminina nestas eleições, embora sejam composições mistas.
É em Iranduba que a pedagoga Graça Lopes (MDB) concorre à vaga de prefeita com chapa 100% feminina. Ela é viúva de Nonato Lopes, ex-prefeito do município. A vice dela é Maria Lopes, de 37 anos.
Já em Maraã, Vera Rodrigues (PSD) e Maria Marques (PSDB) brigam pelo posto de prefeito e vice. Ambas são professoras e concorrem, entretanto, com outras cinco chapas formadas por homens.
De acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), das 24 candidaturas femininas para as prefeituras do Amazonas, somente duas foram indeferidas: a de Sansuray Xavier (PSD), com recurso, em Anori; e a de Ecila Cabral (Avante), em Jutaí.
Enquanto isso, a candidatura de Janete Lobo (PSD), do município de Careiro, está pendente de julgamento.
Maria Lucir de Oliveira (MDB), em Beruri; Maria de Paula Oliveira (PSDB), em Ipixuna; Denise Lima (Progressistas), em Itapiranga; Gracineide Lopes (PSC), em Japurá; Eliana Amorim (MDB), em Pauini; e Maria Josefa Alves (Patriota), em Urucará, são candidatas que buscam reeleição em seus respectivos municípios.
Recentemente, o presidente do TSE, ministro Luís Barroso, declarou que, entre os desafios para mulheres na política, está a “superação de uma postura extremamente sexista na sociedade brasileira”.
De acordo com Barroso, o “déficit de participação feminina na política” não faz jus ao eleitorado brasileiro, formado por uma maioria de mulheres. Esse número representa mais 50% do eleitorado.
Manaus, por sua vez, não tem candidata à prefeitura neste ano. Entretanto, quatro mulheres concorrem à vaga de vice e se colocam como coadjuvantes nas candidaturas das 11 chapas. Algumas dessas chapas são formadas por velhos políticos que tentam voltar a governar a cidade.
São essas as candidatas: Conceição Sampaio (PSDB), vice de Alfredo Nascimento (PL), Maria Auxiliadora de Castro (PSTU), vice de Gilberto Vasconcelos (PSTU), Dôra Brasil (PCdoB), vice de Marcelo Amil (PCdoB), e Marklize Siqueira (PT), vice de José Ricardo (PT).
Desde o direto ao voto das brasileiras, em 1932, houve avanços, mesmo com participação tímida das mulheres na política, conforme consta no TSE.
Números e poder
Em seguida, Ivânia apresenta números: “No Brasil, são 147,9 milhões de eleitores dos quais 77.649.569 são mulheres (52.49% do total de eleitores)”, destaca. “No Amazonas, diz a professora, onde o eleitorado cresceu em 7.88%, este ano, são 2.503.228 eleitores e, destes, 1.283.669 (51%) representam o eleitorado feminino”. E complementa esses números: “Em Manaus, dos 1.331.613 eleitores, 704,2 mil (52.9%) são mulheres”.
De acordo com Ivânia Vieira, “o potencial dessa realidade é estupendo, por isso, a estrutura de poder atua para contê-lo e manejá-lo a exercícios da subalternidade”.
Conforme a professora, “quanto maior for a percepção e compreensão dele (do poder feminino) os efeitos irão desmantelar a máquina e outra lógica de poder terá sido instituída”.
No entanto, explica a especialista, conhecer contextos da história da humanidade é uma das exigências para situar os lugares de ausência ou acanhada presença numérica de mulheres em cargos majoritários dos poderes Executivo e Legislativo.
Para ela, as tensões produzidas entre quem se apropria, narra os acontecimentos e as vitórias e aqueles/as que deles participam não são explicitamente expostas.
“O relato da história é, majoritariamente, roteirizado e escrito por homens. É essa a versão que circula e é ensinada nos núcleos familiares, em igrejas e nas escolas dos três níveis de ensino ambientes onde se formam parte dos futuros integrantes desses poderes. Trata-se de um vigoroso projeto/programa manejado pelo patriarcalismo. Onde estão as mulheres participantes ativas nos acontecimentos que se tornaram parte da história? Por que os relatos as tornaram invisíveis e, assim, negaram a presença das mulheres neles? É nesse contexto da cultura patriarcal que a construção social da noção de “resistência” do eleitorado feminino às candidaturas femininas tem sido apresentada e reafirmada”, defende Ivânia.
A professora destaca ainda que o mundo acompanha o dado novo da história política norte-americana. Ela se refere a eleição da primeira mulher como vice-presidente dos EUA e da primeira mulher negra, Kamala Harris.
“Parte dos analistas, da mídia e do imaginário social tende a trabalhar na mulher candidata performances típicas de homens candidatos, cobrando delas elementos constituintes dessa performance masculina e, com frequência, machista, racista e sexista. Na sacola da cultura política dominante estão pacotes que vêm sendo desconstruídos pelas lutas cotidianas das mulheres. Desmantelar ideias ensinadas e reproduzidas de que “homens não choram, homens sabem como lutar, homens são fortes, e política é coisa de homem” tem sido a longa batalha realizada em terreno de profunda desigualdade. A política é construção social e dela todos devem ser parte, preferencialmente ativa”, enfatizou Ivânia.
Manaus
Conforme Ivânia Vieira, que também é doutora em processos socioculturais na Amazônia, alguns elementos reunidos a partir de Manaus fornecem pistas no exercício de compreender o porquê da presença numérica pequena das mulheres amazonenses na política. Ela explica que em 73 anos de Câmara Municipal de Manaus (CMM), 43 mulheres tiveram assento na Casa.
A primeira bancada de vereadores tomou posse em 1947 e somente na 5ª legislatura, de 1964-1969, é que no quadro de 11 vereadores há o registro de uma mulher, Léa Alencar Antony. Depois, na 8ª legislatura (de 1977 a 1983), entre os 21 vereadores estavam Beth Azize e Otalina Aleixo. Para a atual legislatura foram eleitos 41 vereadores, destes, cinco mulheres.
“Não se trata de incapacidade feminina para a atividade político-partidária, e sim de como funcionam as engrenagens do modelo político-partidário que se conformiza pela exclusão de muitos – mulheres, indígenas, negros, quilombolas, dos que têm identidades de gênero e orientações sexuais divergentes do binário masculino e feminino. É uma estrutura em si violenta e propagadora da violência quando se expressa pela negação da igualdade de participação: uns estão autorizados a ser parte dela; outros são remetidos à noção de incapacitados. Ironicamente, seus votos e participação em campanhas políticas são caçados com avidez”, diz.
Em relação a nenhuma mulher estar concorrendo ao cargo de prefeita da capital, a especialista acredita que existem mais perguntas a serem respondidas que resposta prontas.
Ela questiona o fato de caciques dos partidos políticos não abrirem espaço à participação das mulheres como “cabeça de chapa”.
De acordo com ela, o Brasil aparece em situação ruim em todos os rankings de participação da mulher nos espaços de poder. A presença feminina no Poder Executivo, por exemplo, numa relação de 186 países pesquisados, o Brasil está na 161ª posição (Projeto Mulheres Inspiradoras/2018). Já a classificação da presença feminina no Poder Legislativo brasileiro é de 140ª. Os dados estão em estudo que envolveu 191 países e foi divulgado este ano pela União Interparlamentar/ONU.
“Há avanços, lentos, mas que estão ocorrendo. Precisamos nos animar com eles, fazê-los notícias e contribuir, como comunicadores, na tarefa diária de promover diálogos sobre mulher, política e participação nos espaços de poder; conversar com as crianças, com as meninas, os jovens. São eles que irão fazer a outra etapa da caminhada histórica da luta das mulheres, em todo o mundo, pela conquista de direitos e respeito a elas, a nós. Isso significa o outro mundo possível. As mulheres amam a vida e todo dia tecem um gesto, dão um passo na construção das escritas de novas páginas da história por elas protagonizadas”, diz a professora.
Do mesmo modo, a jornalista defende que o direito à participação das mulheres na política, no parlamento e no executivo, é um direito humano a ser conquistado plenamente para se tornar natural e não exceção.
Para ela, “uma democracia que nega ou obstaculiza a presença da mulher nos espaços de poder, como o Executivo e o Legislativo, se sente contemplada na sub-representação de mulheres, é frágil, vulnerável e se deixa correr pela doença que pode levá-la a se transformar em outras práticas autoritárias, ditatoriais”.
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Com informações do Portal BNC*