Por León Santiago
Na Transição entre o que o historiador Britânico Eric Hobsbown chamava de era das
revoluções para a era dos impérios, Otto von Bismarck, brilhante estadista conhecido
como “chanceler de ferro” dissertava sobre a existência de três categorias de povos.
Os inteligentes, que poliam-se das experiências alheias para adquirir sabedoria.
Os medíocres, que apenas adquiriam sabedoria através da experiência própria.
Por fim, os tolos e burros que não aprendiam nem mesmo na sua própria experiência.
Um adendo a realidade brasileira, escrito por Ivan Lessa, lembra-se que a cada 15 anos
nós nos esquecemos dos acontecimentos dos 15 anteriores, entre esses, brindamos um
museu de grandes novidades no desenvolvimento econômico do país.
O que mais surpreendia o “Mainstream” da economia nos anos Dilma, era de longe as
falas incongruentes sobre assuntos simples e cotidianos, ou sua ausência de entendimento
técnico sobre o arcabouço econômico brasileiro. Para a surpresa do leitor, o maior pânico
dos economistas era seu malabarismo – Há quem chame de criatividade – em formular
políticas públicas e ideias econômicas de total falta de sinergia tanto com o parlamento,
quanto ao campo científico. Muitas vezes essas, perambulavam teses que já nem mesmo
eram abordadas nos “thinks tanks” mais respeitados do restante do mundo
Entende-se hoje, sobre a prudência de Ivan Lessa assim como, que somos de maneira
“singular” a categoria 3 descrita por Bismarck.
O desalinho da equipe econômica e a falta de sinergia com os formuladores de políticas
públicas, transparece no comportamento dos mercados e no olhar de medo do cotidiano
brasileiro. Em termos econômicos, vivemos surpresas positivas, o que nos traz um cenário
paradoxal. A recuperação da produção, ainda que desigual nos diversos setores, está
bastante forte. Algumas estimativas indicam expansão de cerca de 9% neste trimestre,
outras têm resultados mais modestos, mas acima de 6%. Tudo indica que a recessão deste
ano pode ficar em torno de 5%, bem melhor do que muitos esperavam em abril.
Um sintoma bastante iminente sobre a insegurança desses cenários, é o fator:
economia real X mercado financeiro. A recuperação econômica não se reflete nos
preços dos ativos, a taxa de cambio em contínua desvalorização e taxas de juros de longo
prazo passando 8%.
A razão desse descompasso é a incerteza sobre a condução da política fiscal e da agenda
de reformas – Além da ausência de sinergia entre equipes econômicas. Enquanto o
Banco Central afirma seu compromisso com atitudes técnicas – respaldadas inclusive por
outras entidades de viés monetário internacionais. O Ministério da Economia, flerta com
o populismo econômico e ideias mirabolantes – daí o título do artigo -. Não se deixa fácil
de entender, o apego de Guedes à soluções simples e a soluções com ar “Poker Style”:
ganha-se de um lado, perde-se de outro.
Inicialmente, visualizava-se uma irrealidade na ideia do retorno de uma forma de arrecadação nos moldes de uma CPMF.
Primeiramente, pelo passado. O Brasil entendeu amargamente a dor da CPMF, por 11 anos
de implementação – talvez isso enfatize nossa colocação na terceira categoria de
Bismarck – que inicialmente o governo enfatizava como uma questão provisória para o
financiamento de determinadas atividades, mas já dizia o Nobel de economia, Milton
Friedman:
“Nada é tão permanente quanto um programa temporário do governo.”
Em segundo lugar, devemos nos perguntar como economistas ou – ao menos – como
respeitadores da ciência.
O que as pesquisas cientificas tem a nos dizer?
As pesquisas mais relevantes sobre o assunto são do doutor Felipe Restrepo, em seu Paper
publicado no “Journal of International Money and Finance”, onde o economista usa a
experiência de países da América Latina para avaliar o impacto de taxar transações bancárias sobre o crédito e o crescimento industrial.
Já no abstract ele deixa suas evidências:
“I find that taxing bank transactions has a significant negative effect on economic growth,
mainly by reducing the growth prospects of industries that are more susceptible to
financing frictions.”
“O tipo de imposto que o governo parece querer trazer de volta tem impacto negativo no
crescimento econômico. O autor identifica uma redução no crédito disponível para o
setor privado com aumento da retenção de dinheiro vivo e redução do uso de depósitos
bancários. Essa redução no crédito afeta o crescimento penalizando principalmente
indústrias mais sensíveis a distorções no mercado de crédito. O autor faz testes para
verificar se os resultados são robustos e se não podem ser explicados por outros fatores.
Esses testes não mudam a conclusão de que imposto sobre transações reduz
crescimento.” – Resumo de roberto ellery, sobre o artigo de Restrepo.
Aos leitores mais curiosos, existe um capítulo no livro escrito por Andrei Kirilenko e
Victoria Summers, que também trata sobre as consequências dessa “anomalia econômica”, dessa vez, esses tratam sobre a desintermediação e a abertura de contas em
outros países.
A OCDE classifica o imposto nos moldes da CPMF como o 2º mais prejudicial que existe
para a economia.
A CPMF, traz uma falsa ideia que simples heurísticas da economia comportamental
podem evidenciar. A ideia central seria desonerar a folha de pagamento, isso possibilita
maior geração de empregos e menor custo de produção. Ideia que tem total respaldo
científico.
Mas, voltando ao ponto do “Poker Style”.
De fato, a diminuição do custo de produção é benéfica, porém a outra esfera – que parece
ser invisível ao governo – é que esse tipo de imposto distorce a economia como um todo,
aumenta os custos de transações, eleva o custo de crédito – que já não é dos mais baixos
– e consequentemente tem impacto direto na renda dos consumidores.
Sobre esse último a resposta é clara e evidente:
Impacto na renda do consumidor = consumidor com menos renda = consumidor com menos acesso à bens e serviços = queda da demanda = queda de preços = diminuição das receitas.
Disclaimer: imposto nos moldes da CPMF não consideram se a atividade tem ganho econômico ou não. O imposto é cobrado da mesma forma. Além de ser cumulativo, cobrado a cada transação. Praticamente, a contra mão da redução de juros.
Economistas brasileiros contra CPMF
Fundação Getúlio Vargas sobre países que experimentaram CPMF’s
Saindo do âmbito da ideia mirabolante 1, entenderemos o “Renda Cidadania” e que tipo de Dilma-Guedes é esse?
Falando de pandemia e crise econômica, devemos levar em conta o fator social e tivemos um choque imenso na economia brasileira e é evidente nesse cenário quem são os mais lesados – os que menos tem -. Um diagnóstico muito transparente sobre essa realidade, é o fato da redução do percentual de pessoas na “Extrema Pobreza” em plena pandemia por conta do auxílio emergencial, uma medida com o intuito da extensão desse não só é respaldada tecnicamente como é de extrema importância nas políticas de mitigação dos impactos pós-corona.
A problemática se concentra na forma de financiamento do programa, problema esse que nasce no endividamento público, a questão fiscal do Brasil é um problema metastático, apresentando déficit primário todos os anos, ou seja, o país gasta mais do que arrecada, um grande temor principalmente para um país que está enjaulado na armadilha da renda média.
Para manter a confiabilidade do país no que tange aos investidores e ao mercado, foram criadas regras e “âncoras fiscais” para que o risco do abismo – ou seja, que a dívida pública fique impagável – seja contido. Regras criadas deixam bem claro que a importância não se baseia em aumento da arrecadação – mais impostos -, mas na contenção de gastos.
Via de regra a PEC do teto de gastos.
A ideia inicial era o “Renda Brasil” que foi recusado por Bolsonaro pela prerrogativa de que ele não defenderia um programa de transferência de renda que fosse financiado por outros gastos sociais – ou para os mais canhotos “investimentos sociais” rs -. Então o programa voltou para equipe técnica para uma reelaboração onde a política econômica teve um encontro romântico com o populismo econômico.
Dessa reelaboração nasceu o “Renda Cidadã”, mais um projeto com viés de “malabares. A escolha do financiamento corre por uma das mais desonestas das propostas; financiar o programa de transferência de renda através do Fundeb ( fundo que complementa o salário do professores) 5% – se a regra entrasse em vigor equivaleria a R$ 8 bi – e na limitação no pagamento anual de precatórios a 2% da receita corrente líquida – R$ 38,7 bi iriam para o renda cidadã.
A ideia não se passa de um subterfúgio para driblar o teto de gastos, mostrando que o governo ironiza a lógica por traz da PEC. Não se trata apenas vetar despesas punindo determinados setores, mas um apelo ao corte de gastos do governo que possui situação fiscal preocupante, feito assim mostrando ao externo nosso desleixo quanto a responsabilidade fiscal, como era no governo da gêmea “bivitelina ” de Guedes que por muito menos irresponsabilidade fiscal, sofreu um impeachment.
Por sinal, não só economistas concordam sobre a tese de pedalada fiscal e contabilidade criativa.
Um dos mais respeitados juristas do país, Miguel Reale Jr. – autor da tese do impeachment de Dilma Roussef e de Fernando Collor – manifestou sua opinião sobre o assunto, alegando que há crime de responsabilidade:
“Com certeza, trata-se de crime de responsabilidade. A proposta transforma uma determinação orçamentária em dívida, posterga o pagamento. É um calote.” Miguel Reale
Precatórios são como despesas obrigatórias, como dívida. Usar da prerrogativa que não entram no cálculo de dívida pública do banco central como álibi, pode ser considerado inclusive pratica de contabilidade criativa. Dessa forma, implicando na erosão da prática da reponsabilidade fiscal do país ao externo, relacionado ao uso de recursos do Fundeb, a prática coloca em cheque toda a solidez da PEC de gastos da gestão Temer-Meirelles, trazendo a tona a queda da confiança que já foi refletida na estabilidade do mercado e na desvalorização do Real.
Encerro a crítica com a opinião de alguns notáveis da área sobre o malabarismo de bolsonarista:
“Se você arbitrariamente diz que pode pagar, mas não vai, que vai jogar para frente,
prejudicando o credor, e ainda fazendo isso para gastar mais, mas não em troca de uma despesa que cortou, sem promover ajuste nenhum, você simplesmente está usando um subterfúgio para cumprir o teto”
– ex-secretário do Tesouro Nacional e Diretor da ASA Investments, Carlos Kawall.
“Nós temos um problema sério de credibilidade das contas públicas e com essas confusões o governo não ajuda em nada” – Roberto Ellery, Professor da UNB.
“Você diz que vai trocar uma despesa hoje [dos precatórios], que vai gastar menos com ela para gastar com o programa [Renda Cidadã], mas não é verdade, lá na frente você terá um gasto ainda maior, porque em algum momento você vai estar pagando o programa assistencial e os precatórios.”
– ex-secretário do Tesouro Nacional e Diretor da ASA Investments, Carlos Kawall.
“Precatório é despesa obrigatória, tem que ser paga. Se não vai pagar, é postergação de
despesa.”
“está se financiando junto aos credores do erário para fazer novas despesas”.
– Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper
“uma forma de furar o teto de gastos clara e cristalina”,
o governo deu “claros indicativos de que está flertando com a irresponsabilidade fiscal”
-Ana Carla Abrão, diretora da Oliver Wyman no Brasil e ex-secretária de Fazenda de Goiás.
“Tem jeito de calote, cara de calote, tem tudo para ser definido como tal. Só não é porque não declarou que não vai pagar, mas que vai seguir um fluxo ligado à receita. Isso é muito ruim, porque os afetados não terão certeza de quando irão receber”
– Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI)
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