A atriz global Regina Duarte, de 72 anos, aceitou ao convite formal do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), na última semana para assumir a Secretaria Especial de Cultura do governo. Criada pelo presidente no lugar do extinto Ministério da Cultura, a pasta perdeu credibilidade entre a classe artística e se vê ao redor de pessoas que desconhecem os problemas que o tema enfrenta no país. No dia em que assumir, Regina estará debruçada em uma pilha de problemas, que vão desde o orçamento limitado até a precariedade em que se encontra a Secretaria.
Na semana passada, o presidente confirmou o “sim” de Regina, sem dar prazo para que ela assuma as funções. “Está tudo certo, está caminhando, ela está acertando as questões pessoais dela. Não tem prazo”, afirmou Bolsonaro após encontro com a atriz, que também comentou o assunto ao deixar a sede do Executivo na semana passada. “Sim [aceitei], só que agora vão ocorrer os proclamas [trâmites formais] antes do casamento”, afirmou Regina.
Regina encontrará muitas dificuldades administrativas frente à Secretaria Especial de Cultura. Mas o fato é que na vida pessoal e artística, os problemas já começaram. A atriz global possuía um contrato com a Rede Globo que garantia a ela um salário mensal de R$ 60 mil reais quando não estivesse atuando e de R$ 120 mil, se estivesse no ar em alguma produção. Como previsto no contrato, a emissora anunciou a demissão da atriz logo após ela confirmar que assumiria o cargo público. Demitida da emissora, a atriz passará a receber R$ 17 mil mensais do governo. De acordo com O Globo, Regina confidenciou a amigos que não sabe como vai se manter.
Confira o vídeo do Jornal Nacional sobre a demissão da atriz:
Regina Duarte foi convidada pelo presidente para assumir o cargo de secretária especial da Cultura após a exoneração do dramaturgo Roberto Alvim, no último dia 17 de janeiro, acusado de utilizar tom nazista em um vídeo divulgado nas redes sociais.
Atribuições da Secretaria de Cultura
Cabe à Secretaria Especial da Cultura atuar na formulação de políticas, programas, projetos e ações que promovam a cidadania por meio da cultura. São também de sua responsabilidade a promoção do acesso aos bens culturais, a gestão da economia criativa brasileira e a proteção dos direitos autorais. O setor audiovisual e a Agência Nacional do Cinema (Ancine) estão sob o guarda-chuva da secretaria, assim como o Programa Nacional de Cultura, o Programa de Incentivo à Leitura, o Programa de Cultura do Trabalhador e o Programa Nacional de Apoio à Cultura, este instituído pela Lei Rouanet.
Atuação política de Regina Duarte
Sua aproximação com a política começou em meados dos anos 1970, durante a ditadura militar. Ela, inclusive, chegou a subir em palanque no Vale do Anhangabaú ao lado de Lula pela campanha das Diretas já. Nessa época, passou a ter mais contato com Fernando Henrique Cardoso. A relação com FHC foi se estreitando e, em 1998, quando ele se candidatou à reeleição ao Palácio do Planalto, lá estava Regina Duarte de novo pedindo votos.
Nas eleições de 2002 Regina teve sua participação política mais lembrada e polêmica. Ela apoiou políticos do PSDB, incluindo José Serra, que disputava a Presidência da República. No programa eleitoral do candidato, a atriz declarou, em tom grave: “Estou com medo”. O temor era de que Lula fosse eleito, o que acabou ocorrendo, e que isso implicasse revés para a economia. O vídeo motivou uma reação do PT em que a atriz Paloma Duarte diz ter procurado o partido para mostrar sua indignação com relação à campanha de Serra, a quem acusou de fazer terrorismo psicológico.
Em 2018, declarou seu voto em Jair Bolsonaro, que já a havia sondado anteriormente para assumir a Cultura no governo. De acordo com reportagem publicada pela revista Veja, a atriz deve R$ 319,6 mil aos cofres públicos por irregularidades no uso da Lei Rouanet.
Leia mais: Regina Duarte tem dívida com a Lei Rouanet de R$ 319 mil
Apoio e crítica da classe artística
A atriz brasileira, que tem 54 anos de carreira, foi criticada por alguns de seus pares por publicações com fotografias de diversos colegas de profissão no Instagram, alegando apoio a sua decisão de assumir a Secretaria. Alguns destes artistas não gostaram de ver suas imagens ligadas ao Governo. Horas depois a postagem foi apagada e substituída.
Artistas que foram citados nas publicações criticaram a menção. A atriz Maitê Proença comentou a publicação e esclareceu que não gostou da atitude e que não apoia o governo Bolsonaro. A atriz Carolina Ferraz pediu a Regina Duarte que removesse sua foto da postagem. Regina apagou a publicação e a substituiu por outra, com a atriz Carla Daniel no lugar de Carolina. Mas Carla também reclamou.
O áudio de WhatsApp enviado por Carolina a Regina vazou e viralizou na internet. “Espero que você faça a diferença. Mas eu não quero ser usada como alguém que está ali no teu Instagram porque dá a entender que eu apoio o governo do Bolsonaro e eu não apoio, Regina. Eu nunca aprovei e nunca compactuei com esse governo e inclusive não votei no Bolsonaro. Achei muito indelicado da sua parte. Gostaria, com todo carinho, que você por favor pedisse a sua equipe pra que retirassem a minha foto”, disse Carolina.
A atriz Lucélia Santos comentou que tem muita admiração por Regina Duarte, mas que não será bom para a atriz participar da gestão de Jair Bolsonaro. Ela disse ainda que Regina mudou seus valores de décadas passadas e que hoje a preocupação dela é voltada mais ao agronegócio e menos às artes.
O ator José de Abreu, sempre polêmico por defender a esquerda abertamente em suas redes sociais, criticou duramente a decisão de Regina. Em uma publicação em que compartilhou o título de uma matéria da revista Veja, o ator José de Abreu comentou a decisão da atriz Regina Duarte por aceitar o cargo de Secretaria da Cultura oferecido pelo presidente Jair Bolsonaro. Na legenda da publicação, o ator transcreveu um versículo bíblico dizendo “Pai, perdoa-lhe, porque não sabem o que fazem”, e completou dizendo: “tomam Seu Santo nome em vão para trabalhar para um homem que enaltece demônios”, referindo-se à fala da atriz de que a missão na cultura seria um ‘chamado divino’, como ressalta o título da notícia.
O ator Thiago Gagliasso foi um dos que saíram em defesa de Regina Duarte. Irmão de Bruno Gagliasso, o artista foi nomeado, em 2019, pelo governador Wilson Witzel para assumir a Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro. “A falta de apoio de muitos artistas a Regina Duarte deixa claro que o viés ideológico está acima da sua preocupação e amor pela cultura. A cultura não tem ideologia e ela sempre existirá. Quem não vai fazer parte da cultura que o povo precisa são eles e é melhor assim”, destacou.
O humorista Márvio Lucio, conhecido como Carioca, que ganhou fama nacional no programa Pânico na TV, também defendeu a colega e nova secretária de cultura do Governo Bolsonaro. O artista utilizou suas redes para expôr seu apoio à sua nomeação e mandou indiretas para os críticos.
Ex-jornalista da Band, Fabio Pannunzio também surpreendeu e saiu em defesa da escolha de Regina Duarte para a Secretaria de Cultura. Contra o Governo Bolsonaro, o jornalista disse que ela não é nazista, ao contrário do ex-secretário Roberto Alvim. “Olha, podem me apedrejar à vontade. Mas a Regina Duarte na Secretaria de Cultura é um avanço enorme em relação ao nazista maluco Roberto Alvim”. Em seguida, Fabio defendeu Regina. “Ela é de direita e conservadora, mas não é nazista nem doida. Tomara que contrarie todas as expectativas e prove que todos estávamos enganados”, desejou o jornalista.
“Regina Duarte tem todas as condições para assumir a Secretaria de Cultura, e integrará a parte tecnicamente competente do governo Bolsonaro”, escreveu o jornalista Merval Pereira. O colunista do Globo considera que a atriz “conhece bem o ambiente cultural brasileiro, é séria e sensata”… e não é “adepta dessa política de bateu, levou, e de ficar falando mal das pessoas pelas redes sociais”. Merval Pereira opinou que “até agora, foi a melhor indicação do governo Bolsonaro para a Cultura”.
Por Cíntia Ferreira, do Portal Projeta